Sem poesia, a vida seria a morte.


segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011



Entre


um intervalo,

uma pausa

entre sentir a dor e anestesiar...

um momento que se estende, tenso,

esticado

como uma corda de violão prestes a soltar

e canta seu último som na espera


do instante em que te sonho

até no que me desperte

o que me preenche é o estar entre um tempo e o próximo

num deserto de respirar

entre o gostar e o estar só


com um sabor que me esqueço a cada dia

e um cheiro teu que me lembra

o pequeno espaço entre estar feliz e ser triste. CQ

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Transparência

da areia no fundo do mar
do sentimento de pertencer
e de soltar
da dor de estar
e de fugir
de andar
ou de voar

de curar
ou até viver. CQ

sábado, 26 de fevereiro de 2011


O tempo que me falta


Janeiro já desapareceu na segunda semana

E chega hoje com cara de quem não tem nada com isso

vestindo roupa de fevereiro e reclamando que o

Carnaval está atrasado e só vai chegar em março.

Que coisa esse tempo agora

Perdi uma quinta feira quase inteira e não encontro

todas as horas que guardei numa noite

para te entregar nesse dia..

O tempo de agora foge para ontem ou algo assim

para um tempo que corre atrás de mim

quando eu tinha seu abraço,

seus olhos,

seus sonhos

e nada mais me faltava

além de tempo.


CQ

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011


Você pensamento


Eu tenho um pensamento que chama

Você

E toda vez que chamo

Você

O pensamento vem

E cada vez que o pensamento chega

Eu penso que quem chega é você

CQ

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Noturno

E como o óleo
sobre a desconsolada cabeça
que não mais o suportasse
quisesse a solidão que te decifra,
mãos em vôo além
da janela aberta
foram beber no ar
teu sortilégio, retrato
da lua e seu inventor.

Olga Savary


24 dias, 24 poesias,
uma dose diária.

Com vontade de ser e poder ser,
o céu da boca na tua boca,
o chocolate da tua pálpebra,
a língua dos teus dedos,
o bordar dos teus pés,
tão comestíveis e tão doces,
tão teus e tão meus.


Agripina Roxo



Uma idéia digna de sentido seria compreender o que ainda me falta e não conheço. Se soubesse e conhecesse, afinal, teria o que buscar ou esperar. Mas ignoro as intenções da minha alma e meu espírito dança e se aquece numa entropia, caos, acaso ou destino e dói o pensar. Meu coração encontra finalmente o seu silêncio, vazio e leve, pairando no meio do peito numa órbita estacionária, rodando em si em busca de um equiílibrio tênue, entre eu e minha existência. Num universo que se fragmenta em muitos, numa expressão necessária, mas tão breve, ligando dois pontos perdidos nesse então "multiverso", uma ponte gasosa entre a mulher e sua alma. Olho em volta e ainda dói o pensar. Padeço de muita realidade. Grave, agonizante, terminal realidade. Espero as horas que se demoram diante do espelho da lua que ilumina esse quarto e mesmo que dure a vida, logo a noite se amanhece. E estarei prestes a despertar no sonho.


CQ em "A Casa"

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Logo vou te encontrar..

Mas a dúvida vai além de saber com que roupa eu vou..
Qual o sorriso que me cobre?
Preciso escolher que palavras vão estar na minha boca além do tom do batom?
Qual a cor da minha voz quando eu for dizer teu nome?

A única coisa que já me escolheu
Foi o brilho dos meus olhos..esse já está em mim..

Mas o que mais me inspira é escolher com qual coração eu vou..

Posso levar meu coração partido e te pedir: conserta. Mas esse não me serve mais..
Posso levar meu coração cheio de abismos e te pedir: salva-me. Mas esse está muito velho..
Pensei até em levar meu coração criança e te pedir: ensina-me. Mas esse está muito pequeno..

Mas experimentei meu coração vazio, tem espaço e uma linda vista..e te convido..entra..
CQ

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011


Ela perguntou-lhe a cor dos seus pés.
Ele respondeu silenciosamente que eram da cor da pedra.
Ela percebeu e sorriu.
Ela gostava de andar descalça,
de esfolar os pés e de os gastar,
gostava de tocar o chão rugoso com as suas palmas...
e de sentir o caminho de uma outra forma, muito avessa.

Ela gostava de pés que se podiam usar,
vestir e calçar,
disse-lhe depois de o seu silêncio terminar.

Ele respingou que os seus pés sabiam amar e podiam ser bebidos como água fresca.
Que os seus pés tinham asas escondidas e segredos doloridos.
Ela apaixonou-se...

Agripina Roxo

O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
começa a não saber o que é o sol
e a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol
E já não podem mais pensar em nada
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos.
.....
quando o começo da manhã está raiando
e pelo lado das árvores
um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão
Pensar no sentido íntimo das cousas
é acrescentado como pensar na sáude
ou levar um copo à água das fontes
O único sentido íntimo das cousas
é elas não terem sentido íntimo nenhum.
Alberto Caieiro

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A noite que me espera

o que mais dificulta viver essa insônia possível
é o resultado da lucidez dos meus olhos
junto com a insanidade dos meus pensamentos CQ

Ilumidade

Água da chuva no

sol que chega de mim

Água do mar que me clareia,

branca já era areia.

Agora luz.

e essa tão minha transparência que me atordoa..

e protege. CQ


























Terra fértil, semente boa, sol ameno, chuva breve...Espera..


Plataforma do tempo

Onze horas.

Esperar sem tempo, relógio parado

Tempo imóvel

exaurido

Onze horas... quase meio dia.

metade da espera,

completa

nunca metade...

metade não completa

caminho

tempo

distância.

Relógio em silêncio

mil vezes

onze horas..

mil vezes quase meio dia..

mil vezes metade do caminho

tempo parado nas onze horas..

A plataforma do tempo

Espera (para sempre) chegar meio dia. Sol a pino

Sem sombras, sem tempo, sem cansaço.

Tranquilidade na tarde - Olga Savary

Ah, derramar-me líquida sobre o mar –
ser onda indefinidamente –
esperar pela primeira estrela e
dela ser apenas espelho.

sábado, 19 de fevereiro de 2011


Atravessar nuvens em busca de uma lua

que de tanto ser lua, quer ser céu

E mesmo lua noite

a lua quase cheia se mostra

clara

tão bela flutua na luz que empresta a ela seu mistério

e o sol, completa seu fogo e se ilumina

pela lua

Pela mesma lua que

misteriosamente se ocupa, sem culpa,

de assistir ao longe a tempestade que chega nos meus olhos castanhos.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Na poesia que me faz lua

Mutante, molda meu corpo

e me contorna, me torna

minguante de dor, (re) Nova, me

cresce e brilha no peito, cheia. CQ

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Vem
Sem nome >>>>Vem >>>>Sem sobrenome, vem... >>>>Traz a sua identidade; >>>>Vem morar nesta cidade pra ficar perto de mim. >>>>Vem >>>>Sem fone >>>>Vem sem telefone, vem... >>>>Com a sua voz macia, >>>>Venha clarear meu dia -conjunção-de um milhão de sóis. >>>>E tudo será verde como a esperança dos faróis; >>>>E tudo em nós, nossa porta, nossa mesa, nossa voz >>>>Será a certeza do amor >>>>em paz.
M.V.


Réplica

Pode ser que já tenha nome
e até sobrenome
talvez tenha fone
e até telefone,
incerta identidade..
talvez já more
na minha cidade

Pode ser que já tenha
uma boa chance se ser feliz nos verdes faróis,
de ser um eclipse
entre os milhões de sóis..

..mas como saber
se o cheiro me respira
sabendo que a voz já me dissolve
na paz?

como saber
se o toque
pode me estremecer?

e se o abraço
pode me conter,

seria muito bom sentir
se os olhos podem me existir

E se o amor me inspira
viver. CQ

Só sei

que nada sei.


..me disseram que quem disse isso foi Sócrates, mas eu não sei não...
Vontade de ir lá fora e ver se a chuva vai dormir bem,
vontade de ser metade,
um quase.
Ficar num susto, como a pergunta distraída quando encontra a resposta que, com fome, a devora.
Seja o que for, saber não sei.
Sinto, e isso chove em mim,
e me transborda. CQ

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Vida estranha

Era uma vez um menino mágico chamado Tédio
Ele tinha o dom de multiplicar o tempo.
Sempre que ele estava presente o tempo duplicava.
Mas ele não sabia o que fazer com tanto tempo.

A menina mágica se chamava Prazer.
Ela tinha o dom de engolir o tempo.
Sempre que ela estava presente o tempo desaparecia.

Hoje sonhei que havia alguém Divino
um anjo de asas fluidas
que fazia o tempo se demorar na menina.

Vida estranhamente feliz esta. CQ

o tempo passa
as coisas mudam
os sentimentos permanecem.
sagrada ordem, mas
o que acontece primeiro?

eu achava que em primeiro lugar o tempo passava, mas
fico em dúvida se as coisas mudam mais rápido que o tempo..
até então que se saiba que os sentimentos permanecem..
ou será que eles estiveram sempre presentes,
antes das coisas, antes do tempo?

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011


Porto

Um pensamento novato vagueava

em mar aberto.

Cansado, fez um porto numa ilha-oásis

e toma sol repousando

sobre uma nova lembrança. CQ


Namorados do Mirante


Eles eram mais antigos que o silêncio

A perscrutar-se intimamente os sonhos

Tal como duas súbitas estátuas

Em que apenas o olhar restasse humano.

Qualquer toque, por certo, desfaria

Os seus corpos sem tempo em pura cinza.

A Remontavam às origens — a realidade Neles se fez, de substância, imagem.

Dela a face era fria, a que o desejo

Como um hictus, houvesse adormecido

Dele apenas restava o eterno grito

Da espécie — tudo mais tinha morrido.

Caíam lentamente na voragem

Como duas estrelas que gravitam

Juntas para, depois, num grande abraço

Rolarem pelo espaço e se perderem

Transformadas na magma incandescente

Que milénios mais tarde explode em amor

E da matéria reproduz o tempo

Nas galáxias da vida no infinito.

Eles eram mais antigos que o silêncio...


Vinicius de Moraes, in 'O Operário em Construção'
Preciso aceitar
de quase tudo
não existe nada
coincidência ou acaso

E por acaso, no caos se nascem flores
e no caos, elas morrem

Preciso aceitar
que tudo que pareça branco
papel de sal
algo que já estava escrito
com letras invisíveis, ilegíveis
talvez incolores

E que agora deixo tanta poesia
mas não posso ler.
Nada mais está escrito. CQ





segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

coração exilado
sem casa
sem paredes
sem caminho

...coração prisioneiro
dos efeitos
dos feitos e
dos desfeitos desse jeito
desfigurado de (querer) ser inteiro. CQ

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Ao pé da letra



Estou com meus pés nas letras

e por elas caminho cuidadosa

nelas me perco e

por elas me encontro


e os (meus) pés sobre as letras

tão brancos e delicados,
trazem meu caminho num papel transparente de seda e
por eles
me ofereço leve, a caminhar com tato

decifrando cegos
essa nova terra, um novo relevo

Aos pés da letra
me deito de um outro jeito

e te adormeço envolto nos braços
pedindo para as tuas palavras

alguma verdade

que me decifre, traduza-te
nesse novo ar, brisa, sem sons,

quietude

Aos pés da letra
me enudeço corajosa
E hoje sinto (de) mais
tanta sede dessa água que me toma

a alma faminta de você

Aos pés da letra,
fecho meus olhos e aprecio

num sorriso, rio
da minha doce e macia
escuridão e
no teu fogo sem luz

me aquece

Aos pés da letra
me acredito
ajoelho-te
e rezo-nos:

que (por amor) as minhas letras te salvem
e me atravesse a nós nesse encontro
e (por amor),

salve-me.


CQ




O teu silêncio sopra
dentro de mim
vento forte
que me espalha as lembranças
e desordena as palavras.

Fecho os olhos
com a força
não encontro mais
como me lembrar
porque teus olhos existiram?

E chega enfim
o tempo que não posso mais ouvir nada
além do teu silêncio.

Gratidão por esse vento emudecido,
grita alto em mim e me espalha
numa desordem que vai e
me busca em resgate, salva-me

há tempos e já posso me dormir
não consigo mais te pensar.
Começo a esquecer?

Respiro,
inspiro a vida
que me testa
e me resta a dor
de ser areia,
Infinita e pequena.

Quanto tempo?
A vida. Aquela que falta.

CQ

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Gosto muito de olhar o mar e
pensar que é ele que me olha.

e o mar...o mar?
Quando o mar me olha, com seus olhos de ressaca
ele me cresce..
sou, sinto, quero, tenho e posso mais.

E cabe em mim esse mar, maior que eu. CQ

queria
que meu único espelho
fossem os olhos de quem gosta de mim

nesses olhos
vejo os meus melhores olhos
os mais brilhantes que já tive
e uma vida nova se ilumina em mim

nesse espelho de olhos que me amam
eu sou mais feliz que eu. CQ