Sem poesia, a vida seria a morte.


terça-feira, 15 de fevereiro de 2011


Namorados do Mirante


Eles eram mais antigos que o silêncio

A perscrutar-se intimamente os sonhos

Tal como duas súbitas estátuas

Em que apenas o olhar restasse humano.

Qualquer toque, por certo, desfaria

Os seus corpos sem tempo em pura cinza.

A Remontavam às origens — a realidade Neles se fez, de substância, imagem.

Dela a face era fria, a que o desejo

Como um hictus, houvesse adormecido

Dele apenas restava o eterno grito

Da espécie — tudo mais tinha morrido.

Caíam lentamente na voragem

Como duas estrelas que gravitam

Juntas para, depois, num grande abraço

Rolarem pelo espaço e se perderem

Transformadas na magma incandescente

Que milénios mais tarde explode em amor

E da matéria reproduz o tempo

Nas galáxias da vida no infinito.

Eles eram mais antigos que o silêncio...


Vinicius de Moraes, in 'O Operário em Construção'

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